segunda-feira, 4 de julho de 2016

Messi entre a cruz e a espada

Por Humberto Pereira da Silva*

ACABOU? Messi lamenta derrota na Copa América
Centenária (Adam Hunger/Reuters)
Lionel Messi falhou contra o Chile, na decisão da Copa América Centenária. Depois do empate no tempo regulamentar e na prorrogação, Messi perdeu pênalti na disputa final e a Argentina, a Copa.

Mais uma vez, pela terceira consecutiva, a Seleção Argentina chega à final nos últimos três anos e deixa o título escapar. Mais uma vez Messi não consegue ser campeão pela seleção de seu país. E nessa última decisão, para agravar, ele perdeu um pênalti decisivo.

Dias depois, em enquete do UOL para importantes jornalistas esportivos, duas perguntas: qual a responsabilidade de Messi nesses fracassos? Que lugar ele ocupa na História?

Pouco importa quais respostas foram dadas. Melhor, foram espontâneas, resultaram do calor da hora. Justamente por isso elas, e quaisquer outras, dizem alguma coisa tanto quanto não dizem nada. Sobre as questões do UOL, então, vale apenas especular.
PRIMEIRO REVÉS: Ainda coadjuvante, Messi caiu para um
Brasil reserva na final da Copa América de 2007 (Getty)
Para a expectativa geral, com o que fez e conquistou pelo Barcelona, Messi fica exposto a extremos: vencendo é endeusado; perdendo torna-se alvo de críticas sem meio termo.

A derrota é imperdoável para um craque na sua condição, daí a cobrança desmedida. Mas futebol, não nos esqueçamos, é um esporte coletivo: somente a miopia de muitos faz crer que individualidades são necessárias e suficientes.

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A situação que se oferece a Messi na Albiceleste não é a mesma da do Barcelona. Na seleção, falta-lhe uma condição essencial, vital: alguém que assuma a liderança da equipe, um Iniesta, e assim lhe permita somente jogar futebol.
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Messi não conseguiu levar Argentina ao título (Xinhua/TELAM)
Na Argentina, nenhum jogador tem o papel de Iniesta. Com isso, Messi é colocado na posição de assumir um papel para o qual não tem qualquer aptidão: liderar. Messi não tem predisposição para ser líder.

As razões para isso não cabem em especulações dadas no calor da hora. De fato, como já foi levantado sem esclarecimentos plausíveis, ele sofreria de Síndrome de Asperger? Se não, o fato é que diante de uma situação desfavorável, na qual se esperaria dele ser mais que um jogador extraordinário, ele sucumbiu à pressão.

No futebol, o individualismo, a magia de um craque, não é suficiente numa situação de decisão. Messi falhou em grande parte nessas três decisões de que participou porque nelas ele contou somente com seu extraordinário talento.

Um extraordinário talento, contudo, pode ser uma condição necessária, mas não suficiente. Messi não é dotado da capacidade que alguns poucos jogadores têm, mesmo que tecnicamente menos talentosos, de controlar, estabelecer o ritmo de uma partida e assim comandar seus companheiros. Se essa capacidade foi um fator decisivo, Messi não pode ser cobrado pelo que não podia oferecer.
TERCEIRA FINAL PERDIDA No Chile, Argentina cai nos pênaltis
 para o time da casa. Messi marcou o seu (Veja.com/AFP)
Mesmo assim não deixa de ser incomum uma equipe chegar a três decisões seguidas e perdê-las. Um detalhe ou outro no jogo de circunstâncias e a Argentina teria vencido esta ou aquela das três decisões.

Sim, mas o fato e que a Argentina e Messi perderam as três. E é na decisão, efetivamente, que se mede a pressão sobre um jogador fora-de-série. Perder as três deve trazer alguma coisa sobre a incapacidade emocional de Messi na hora H.

A esse respeito, a segunda questão da enquete do UOL: que lugar lhe cabe na história?

O futebol legou uma galeria de jogadores fantásticos. Messi está entre estes. As circunstâncias de seus fracassos na Seleção Argentina, contudo, alimentarão polêmicas. O que me parece mais notável é que seus insucessos na seleção lançam dúvidas sobre suas conquistas no Barcelona.
MAIOR DOR Messi perde pênalti e é vice pela
 quarta vez com a  Argentina (Getty) 
Quer dizer, se futebol fosse exclusivamente talento com a bola nos pés, não seria exagero sustentar que Messi é o craque mais maravilhoso que o futebol conheceu. Mas futebol não se restringe a talento individual. Independentemente de números, estatísticas e folclores, na hora H Pelé ou Maradona foram assustadoramente colossais.

Diante deles, para mim, na hora da decisão Messi é pequeno; carece de alguém do lado para que despreocupadamente possa exibir seus dotes de fora de série.

*Humberto Pereira da Silva, 52 anos, é professor 
universítário de Filosofia e Sociologia e crítico de
cultura de diversos órgãos de imprensa.

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